Não havia ninguém por aqueles lados, estava deserto.
O carro começou a deitar fumo pelo capo e eu comecei a assustar-me, tentava gritar e agitar o meu corpo para sair dali, o que me provocava dor uma vez que estava presa.
Passou-me todos os meus anos de vida pelos olhos vermelhos e assustados, desde pequena até as amizades de agora. Pensei que ali seria o fim e uma forma de ir ter com a minha mãe, mas perante este pensamento, do nada, os meus pés se conseguiram soltar e saí do carro. Não sei se foi um sinal ou não como resposta ao meu pensamento, mas que entendi como uma ordem para sair dali.
Meia atordoa-da e ferida na perna com um corte, em que o sangue trespassava pela meia-calça cortada e que me fazia andar coxa devido á ardência que me provocava, tentava procurar um lugar isolado para que pudesse ficar em paz. Só queria estar sozinha, sem ninguém preocupado comigo a dizer que tudo iria passar, porque não ia.
Estava perante uma praia á qual desconhecia, mas bastante bonita e deserta. Ainda com dificuldade caminhei até á areia. Mal a senti uma lembrança apoderou-se de mim, trazendo consigo um dia lindo de praia com a minha mãe.
Lembrança 04 de Julho de 2000:
Tinha andado a chatear a mama a semana toda para ir á praia e hoje ela aceitou. Estava toda entusiasmada que me vesti depressa. A mama ligou á tia Linda para vir connosco.
Quando a tia chegou com Tiaguinho, prepararam o lanche e fomos logo para a praia.
Tinha os meus 9 anos e adorava ver aqueles senhores em cima das ondas, até parecia que dançavam. Quando caíam corria sempre por mim a cima um arrepio. Eles podiam-se magoar. Eu estava sentada na areia a fazer os castelos que tanto gostava e o Tiago a buscar areia. Estava quase na hora de almoçar então a minha mãe chamou-nos.
- Ana! Tiago! Vinde papar. - dizia a mãe com a voz doce.
- Ana, quem chegar em ultimo não come! Ahaha, vais perder! - dizia ele já a correr.
- Como como! - Aquele estúpido tinha chegado primeiro. - Mãezinha, eu quero comer por isso és tu que não comes!!
- Ai é? Então anda cá, anda. - pegou em mim e começou-me a fazer cocegas.
- Ai, pára, pára. Está bem, come lá. - dizia por entre gargalhadas.
----------
Senti o meu corpo desfalecer e a saudade apertou-me o coração. Não podia ter perdido a minha mãe, não podia. Tinha que ser mentira.
Caminhei perante um choro contínuo até dois rochedos. Aquilo não me estava a acontecer.
Sentia dor, raiva, tristeza, saudade, sentia tudo, e não sentia nada. Sentia dor por todo lado, tanto de estar aleijada como da saudade que me invadia o coração. Ao mesmo tempo, sentia-me vazia, vazia como nunca me sentira antes. Faltava ela, só ela.
(Visão de Rita)
No ecrã do telemóvel vi que era o seu primo e olhei para o Rúben com uma cara de confusa. Mesmo assim apressei-me em atender.
- Estou? Rita?
- Sim, sou eu. Passa-se alguma coisa?
- A Ana está contigo? Diz-me que esta! - ele estava com uma voz de preocupado o que me fez ficar de novo também.
- Não Tiago, não está. Não a vejo desde que ela saiu da minha beira hoje no jogo. Ela não me disse mais nada. Vim para casa e ela não está. Também queria saber. Mas o que se passou? - Estava visivelmente preocupada.
- Rita, a mãe dela, a minha tia... Ela faleceu. - Senti um inicio de choro vindo do outro lado e comecei a tremer.
- Óh meu Deus. Onde ela pode estar?! Eu vou procura-la Tiago, não te preocupes!
- Obrigada Rita. Assim que souberes qualquer coisa liga-me.
Não estava a acreditar naquilo. Eu não falava e comecei a sentir as minhas pernas a tremer e o meu pensamento foi interrompido pelo Rúben.
- Rita, que se passa? Quem era?
- Era o primo da Ana. - disse ainda meia paralisada. - A mãe da Ana morreu Rúben. E eu não sei dela...
- O quê? Mas... Calma Tááh. vamos encontra-la. - disse tentando acalmar-me e passando a sua mão pela minha cara. - Sabes onde ela possa ir?
- Não Rúben. Não era costume ela ficar mal. E quando estava em baixo refugiava-se no quarto. Com a musica, e, só se...
- Só se? - Interrompeu-me com um pouco de ansiedade.
- As piscinas! As piscinas Rúben. Vamos!
Pegamos nas coisas e saímos a correr em direcção ás piscinas. Ela só poderia estar lá.
Chegamos dez minutos depois. Corri em direcção á recepção e vi que estavam a fechar.
- Boa noite. Não está aqui nenhuma rapariga chamada Ana?
- Não minha senhora. Não esteve aqui nenhuma rapariga com esse nome. Nem durante o dia todo.
- Obrigada. E desculpe.
Corri para junto do Rúben e abracei-o. Estava a precisar daquele abraço mais do que nunca.
- Não esteve aqui Rúben. Não sei onde ela está. - disse ainda junto ao seu peito com as lágrimas que teimavam a cair. - Não quero que ela faça nenhuma asneira.
- Calma linda. Vai estar tudo bem. Não podes fazer mais nada. Anda para casa. Eu fico contigo.
- Não Rúben, deves estar cansado. Vai descansar.
- Nem penses que te deixo sozinha. Vou ficar contigo hoje.
- Obrigado, obrigado por tudo. - disse apertando-o com força.
- Xiiu
Fomos para o carro e seguimos caminho.
---------
(Visão de Ana)
Senti que havia tanta coisa por dizer. Tanta coisa que podia ter dito e não disse...
Senti-me suja e inútil, e por entre as lágrimas que derramava fui com o meu corpo inseguro em direcção ao mar. Só queria sentir a água fria a larvar-me a alma. Lavar-me de tudo o que podia ter dito e não disse. De todas as "mentiras" que já disse, de todas as coisas que não devia ter feito e que agora não posso remediar.
Senti a água gelada a percorrer-me a cintura, desequilibrei-me e o meu corpo caiu na água como como uma pedra. O meu cabeço tapou-me os olhos e fiquei sem ar. Senti a minha ferida a arder como nunca tinha sentido tal coisa. Amarrei-me a uma rocha e fiquei deitada sobre ela. Não podia mais com aquilo.
Apetecia-me fugir de tudo.
Espero que gostem. Comentem por favor!!
A vossa opinião é fundamental nesta altura.
Beijinhos
Beijinhos
Ana Sousa*